Treinadores de Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo avaliam a evolução de seus times após o estadual
POR CARLOS EDUARDO MANSUR
Jorginho, Levir Culpi, Ricardo Gomes e Muricy Ramalho analisam seus times na reta final do Carioca - Reprodução |
Repetida à exaustão, a sentença é tratada como verdade absoluta: “Estadual não é parâmetro para nada”. Ouvidos pelo GLOBO, os quatro treinadores dos grandes clubes do Rio, semifinalistas do campeonato, coincidem num ponto: problemas de calendário à parte, necessidade urgente de rever o formato à parte, não é razoável dizer que, após quatro meses de treinos e jogos, não seja possível traçar um perfil de seus times.
A história conta que, usar resultados positivos do Estadual como base para concluir que um elenco está pronto para o Campeonato Brasileiro é erro clássico. Treinadores veem tal prática como erro de avaliação, não como um sinal de que a competição local não permita avaliar o elenco.
— Claro que é possível saber se um time precisa de reforços ou não, quais são suas virtudes e limitações — avalia Ricardo Gomes, técnico do Botafogo.
— Há jogos, é verdade, que não servem para nada. Mas é possível conhecer bem o elenco, tirar conclusões sobre o time — concorda o rubro-negro Muricy Ramalho.
Diante de tal pensamento dos treinadores cariocas, a reportagem ouviu, de cada um deles, o que pensam sobre suas equipes. Neste momento, a avaliação mais prejudicada é de Levir Culpi, que assumiu o Fluminense há apenas 50 dias e, entre jogos do Campeonato Estadual e da Primeira Liga, teve pouco tempo de treinamento. Tanto que admite ainda estar “tentando entender este Fluminense”.
Mesmo assim, Levir fala sobre o perfil que tenta implantar no tricolor, enquanto Muricy Ramalho e Jorginho destacam as variações táticas que Flamengo e Vasco têm buscado. Já Ricardo Gomes comenta o esforço de, mesmo com um investimento limitado, tonar o Botafogo competitivo para as finais do Estadual e o Brasileiro da Série A.
Vasco amplia repertório e busca mais equilíbrio
Quando assumiu um Vasco em estado terminal no último Brasileiro, Jorginho fez o time reagir a partir da mudança no esquema tático: implantou o 4-4-2, com os quatro homens de meio-campo formando um losango. Serginho, hoje fora do clube, era o primeiro volante, com Andrezinho e Julio dos Santos mais à frente, um de cada lado, e Nenê perto dos atacantes. No Estadual, celebra a conquista de repertório.
Jorginho diz que o Vasco de 2016 ganhou novas formas de jogar. Com a chegada de Yago Piakchu, pôde variar para um 4-2-3-1 em alguns momentos. Para ele, tal esquema exige jogadores habituados aos lados do campo, como Pikachu e Jorge Henrique. Outra variação foi o 4-3-3, usado no decorrer de partidas com Thalles, Riascos e Jorge Henrique ou Éder Luís.
A vitória sobre o Fluminense na final da Taça Guanabara trouxe alívio não pelo título, mas porque o técnico voltou a ver o time organizado.
— Movimentos que fazíamos de forma ordenada, como a pressão no campo rival, com linhas altas, estávamos fazendo sem organização. Se o time não se move junto para pressionar, estoura atrás — diz Jorginho.
A obsessão por organizar o time tem a ver com a busca por mais controle do jogo e, também, por evitar que um time de média de idade alta tenha que “correr errado”. Outro certeza de Jorginho no Estadual é o papel de Jorge Henrique para manter o Vasco equilibrado entre ataque e defesa.
— Ele é um cara tático. Atua pelos dois lados, ajudando a atacar e marcar, já foi meia atacante e até volante. É quatro em um. Estamos buscando regularidade. Quero que o time se sinta bem em qualquer esquema, sem ter que fazer mudanças de emergência nos jogos.
Flamengo quer variação tática e Cirino artilheiro
Em janeiro, Muricy Ramalho falava do projeto de construir um Flamengo no 4-3-3. A recente adoção do 4-4-2, com a entrada de Alan Patrick junto a Mancuello e Willian Arão, não é um caminho sem volta ou, como avisa Muricy, uma regra. Segundo ele, o Estadual permitiu dar passos na direção de um time que varie entre duas formações.
— Não se vai a um supermercado escolher esquema tático. Depende da característica. Temos homens de velocidade na frente para um 4-3-3, e a chegada do Fernandinho reforça isto. Mas também temos meias como Alan Patrick e Mancuello para o 4-4-2 — diz Muricy.
Para ele, um conquistas no Estadual foi melhorar a posse de bola. Mas houve instabilidade quando a equipe, então no 4-3-3, perdeu Mancuello por lesão. Os jogos e viagens, com poucos treinos, não ajudavam.
Os seis gols de Marcelo Cirino nos últimos cinco jogos dão a Muricy a certeza de que deu resultado um trabalho exaustivo:
— Não é para ele ficar só aberto. É ruim até para a passagem do lateral. Começar a jogada no lado do campo e terminar no meio arrebenta com o adversário. Neymar faz isso. Insisto, mostro vídeo, até a psicologia conversa. Ele finaliza bem, deve buscar a área. Jogador acredita quando vê acontecer e os gols vão ajudar — diz Muricy, lembrando que, no Atlético-PR, Cirino atuava mais em contra-ataque, o que lhe dava mais campo para correr pela ponta.
Muricy lembra que pelo menos cinco titulares atuais não estavam no clube em 2015:
— O time vai ganhando o desenho aos poucos. A formação mudou e a filosofia de jogo também.
Levir ainda tenta decifrar o Fluminense
O time controlador de jogo, dono quase sempre da maior posse de bola, como era seu Atlético-MG nas duas últimas temporadas? Ou um time de soluções rápidas, vertical nas ações ofensivas, como atuou o seu Fluminense na final da Primeira Liga? Levir Culpi, que tem menos de dois meses no cargo, ainda não tem certeza ao responder sobre que identidade terá o tricolor no restante de 2016.
Ele diz ter visto características que permitem os dois estilos. E admite que pretende ver um Fluminense com mais posse de bola.
— Não entendi bem este Fluminense ainda. Para ser sincero, é isso. No Atlético-MG, era uma certeza de que teríamos boa posse de bola. Aqui está misto. Há jogadores com saída de bola boa, como Pierre e Cícero, que nos dão chance de controlar jogo. Há os que aceleram, como Scarpa, Marcos Junior, Édson acelera por dentro. Temos agressividade pelas laterais. O ideal é mesclar. Mas ter identidade no Brasil não é fácil, porque tudo (times e técnicos) muda rápido — disse Levir, fazendo ressalvas sobre a montagem do elenco. — Ainda será preciso trazer jogadores. E alguns sairão. É natural.
Ele diz que a projeção de futuro do Fluminense é feita, por ele, com base em experiências que viveu em outros clubes. Tem tentado reduzir o espaço entre as linhas, encurtando distâncias entre jogadores. E pretende melhorar a posse de bola. Levir surpreende ao dizer que tal exercício começará pelo goleiro Diego Cavalieri.
— Quero que jogue mais, saia menos com chute longo e mais com passe. Não é fácil, mas é importante tentar — disse.
Botafogo aposta em aplicação e força dos volantes
Ricardo Gomes precisou refazer boa parte do elenco do Botafogo com poucos recursos. Se nestas condições a margem de erro tende a crescer, ele celebra o fato de o Estadual lhe ter dado uma “boa noção” das características do novo time.
— Não dava para definir, de antemão, um sistema tático. Precisava de uma leitura das contratações e ir montando. Não pudemos escolher tanto os novos jogadores. Como não tive outras competições (Fla e Flu jogaram a Primeira Liga) e tive tempo — diz Ricardo.
Ele admite limitações, mas destaca uma virtude: a dinâmica dos volantes Rodrigo Lindoso e Aírton, além de Bruno Silva, que tem jogado pela direita no 4-4-2:
— Nossa maior força são os volantes. Eles nos dão bom volume de jogo. Não acrescentam apenas na parte defensiva.
O Botafogo tem atuado com duas linhas de quatro. À frente delas, Salgueiro se movimenta e faz dupla com um homem mais de área, como Ribamar. Pelo centro, Lindoso e Aírton se encarregam das transições para o ataque, ponto exaltado por Ricardo Gomes. Embora não goste de destacar publicamente, a comissão técnica enxerga em Bruno Silva o grande achado do clube no mercado. O que faz falta é o jogador diferente, criativo, que quebre defesas com lances de habilidade.
— Sim, isso falta. Tivemos mais dificuldades contra times que se fecharam — avalia Ricardo. Para ele, quando precisou propor jogo, o Botafogo sentiu a falta de um grande criador, embora tenha rendido bem em jogos francos, como os clássicos. — Precisamos manter o volume, mas ser mais agudos, fazer mais gols.
Fonte: O Globo
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