O Carli foi indicação de um conselheiro nosso, do Rodrigo Farreh, que acompanha muito o mercado argentino. Nem sei por que razão, mas ele assina o Campeonato Argentino, assiste a todos os jogos, e de vez em quando ele dá uma assim: "Gustavo, vê o fulano de tal". Foi assim com o Carli: "Olha, tem um zagueiro lá no Quilmes que já acompanho há muitos anos e é bom jogador". Tinha tido uma contusão, ficou um tempo no banco, mas foi titular a vida inteira e tal. Mandamos para o analista de desempenho, e ele aprovou. Só que o Carli não tinha sido oferecido para a gente, diferente dos outros. A gente entrou em contato com um agente que conhece muito o mercado sul-americano, foi quem fez o contato com ele, e daí a coisa andou. Teve um problema do Quilmes lá com a transferência, tinha uma liminar contra o clube impedindo qualquer transferência internacional. Eles estão até hoje em uma crise, mas naquela ocasião estavam com vários credores na praça. Um deles conseguiu uma liminar que a AFA foi intimada por um juiz. Ele já estava aqui (risos) foi um momento difícil, tivemos que contratar um advogado lá para entender a situação e discutir com a AFA, graças a Deus as coisas correram bem.
(Risos) Sem dúvida, sem dúvida.
Em alguns casos sim, a gente manda o analista para ir ver o jogo. Mas hoje a informação... Esse programa pega as informações das Séries A, B e C do Brasileiro, do Argentino... Às vezes a gente precisa ir muito mais ara conversar com as pessoas, depende se tem acesso ao clube, mas só para ver o jogo em si não tem muita necessidade.
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Esteban Cambiasso Leicester City (Foto: Getty Images) |
É POSSÍVEL TER UMA NOVA ESTRELA COMO O SEEDORF?Talvez. A gente trabalha com esse cenário, mas com pé no chão. Depende muito da negociação, da aposta do jogador... Tem um projeto do clube para o jogador, e do jogador para o clube também. A gente não trabalha com a hipótese de trazer um cara que custe R$ 1 milhão por mês e que não saiba como pagar. Mas a gente trabalha com o cenário de ter um jogador mais tarimbado, digamos assim, que possa atrair a torcida e tal, e que ele aposte no projeto do Botafogo. Em algumas conversas que temos tido com bons jogadores eles têm perguntado isso: "Mas quais são os planos para o jogador?" Acho que hoje tem essa consciência em alguns empresários, e de alguns jogadores, de como ele vai encaixar no elenco. Por exemplo: a gente hoje precisa de um bom jogador de meio campo para conversar com o Camilo, os nossos esquemas sobrecarregam o Camilo um pouco porque a gente acaba tendo volantes, atacantes e ele fica ali no meio um tanto sozinho. Alguns nomes que estamos vendo estão enxergando isso. Sem fazer loucura, pés no chão, mas tentando mostrar um projeto. Essa frase ficou meio que com o (Vanderlei) Luxemburgo porque tudo era "projeto", "projeto" (risos). Mas é um pouco por aí mesmo. Primeiro mostrar a nova realidade do clube, que a gente honra com o que combina, e pensar em menos quantidade e mais qualidade.
POR QUÊ RECUSARAM O CAMBIASSO?No final a gente achou que a aposta era muito cara para o nosso momento. Jogador de idade mais avançada... É difícil fazer esse tipo de balança, né? Achamos que era um risco muito alto para o tamanho da grana que iríamos ter que gastar.
E O BARCOS?Barcos a gente tentou no passado. Tentamos o Viatri também, não deu certo.
O RAUL MEIRELES FOI OFERECIDO TAMBÉM?Não. Tem muita coisa que aparece que a gente acha que alguém tentou plantar.
JOGADORES QUE VOLTAM DE EMPRÉSTIMO SERÃO APROVEITADOS?Estão no elenco, né? A gente vai ter que avaliar, saber se reempresta... Vai depender um pouco da montagem do elenco, posição que estiver carente... Vão ser reavaliados.
PRIORIDADESAcho que um 10 e um 9 a gente vai precisar. Precisa de mais um atacante ali, talvez um que jogue pelos lados... Algumas coisas estão um pouco incertas ainda, temos que ver se o Neílton fica, a lateral esquerda é um problema porque a gente não tem ainda definida, o Victor (Luís) talvez volte para o Palmeiras, mas a gente está tentando manter.
Ao mesmo tempo é um sonho e um pesadelo. Quando a gente assumiu a gestão, sem brincadeira, não é politicagem ou coisa do gênero, mas eu vi uma criança na rua com a camisa do Botafogo e senti um peso nas costas. Botafogo na Segunda Divisão, a gente naquele momento meio que sem saber para onde ir, não tinha dinheiro, o clube estava devendo todo mundo, cheio de penhora, Ato Trabalhista suspenso... Passava por ela na rua, obviamente ela não sabia quem eu era, até hoje não sabem porque minha função é muito mais interna, e eu ficava pensando assim: "Olha o tamanho da responsabilidade". Esse é o pesadelo
Gustavo Noronha
PAPEL DO ANTÔNIO LOPESÉ um cara sensacional. Super correto, tem uma presença de vestiário importante, tem uma história que fala por ele. Um profissional que já viu um pouco de tudo. Em vários momentos difíceis ele foi muito importante. Você vê a importância do profissional quando a coisa vai mal. É difícil você distinguir o bom para o mau profissional quando está tudo bem. Aqueles momentos lá em que estávamos mal no Brasileiro, fizemos aquela mini-temporada lá em Várzea (das Moças). Como eu moro em Niterói, ia muito lá. Era meu caminho do trabalho. Aí ficava o Lopes naquela salinha de vidro em cima, naquele campo lá de trás. Eu entrava: "E aí, Lopes, como que está?". Ele olhava: "Tudo certo. Fica tranquilo que vai dar certo". Ou não, aí falava: "Momento precisando dar uma chacoalhada, mas se fizer isso assim, assim, assado vai funcionar". A experiência de um cara que já viu muita coisa, indo bem ou mal, é muito importante. Eu não sou um cara do futebol, sou advogado. Então você precisa ter os profissionais e colher informações daqui e dali para tomar decisão. Mesma coisa com o Cacá, o presidente... A gente não é do futebol, embora sejamos fanáticos e acompanhamos futebol a vida inteira. Tem coisas que não dá para errar, você sabe se vai ou não. Outra coisa é o clima, do trabalho render ou não... A importância do Lopes é enorme, e às vezes a torcida não vê mesmo porque é um trabalho muito silencioso.
ASSIM COMO O DE VOCÊS...Também, muito silencioso. Quando dá certo é sorte, quando dá errado a gente é incompetente (risos). "Botafogo deu sorte", é o que a gente mais tem ouvido.
COMO INGRESSOU NA POLÍTICA DO BOTAFOGO?Eu sou sócio do Botafogo desde os 9 anos. Mas eu não era politicamente ativo, sempre trabalhei muito. Aí em 2003, o Botafogo estava na Segunda Divisão, e eu comprei uma cadeira no Caio Martins para a temporada, na gestão do Bebeto (de Freitas). Ele fez um plano de sócio-torcedor e tinha uma cadeira VIP que era permanente. Meu nome está até hoje lá, fui esses dias em um jogo do sub-20 e vi que os decalques daquela época ficaram nas cadeiras. Os meus vizinhos de cadeira na época eram todos conselheiros, envolvidos com política. Eu era um torcedor comum, apaixonado, que ia a todos os jogos, até hoje vou a quase todos. E esses caras depois começaram a falar: "Você é um cara que devia estar na política do Botafogo, gente nova, sangue novo, são sempre os mesmos". Essa história ficou na minha cabeça, realmente eu podia tentar ajudar. Esse grupo depois se uniu e disputou a eleição, a gente perdeu contra o Bebeto na ocasião.
COMO CHEGOU A DIRETOR JURÍDICO DO CLUBE?Surgiu a história do Maurício (Assumpção). Ele nem seria o candidato, seria o Mantuano, mas por algumas conjunturas políticas apareceu o nome do Maurício. Ele meio que caiu de para-quedas. Para ter ideia, essa eleição foi em 2008 e eu conhecia a maioria das pessoas do grupo desde 2003, e o Maurício eu conhecia há um mês. Eu era um nome para ser o vice jurídico do Maurício porque teve uma história na época do Bebeto em que ele colocou para votar um monte de sócios com menos um ano de associação. O Estatuto do Botafogo só deixa votar se tiver um ano. Eram uns 150, 200 sócios e eles não puderam votar porque eu entrei com uma ação e consegui uma liminar. Talvez um pouco motivado por essa confusão toda me indicaram para vice jurídico e aceitei. Só que no primeiro ano a gente teve um racha na administração, brigou com o Maurício, e eu renunciei. As divergências eram muito profundas, e eu fui ser oposição. Perdemos a eleição quando o Maurício foi reeleito. Pelo Estatuto, a chapa que perde elege 14 conselheiros para o Conselho Deliberativo, e eu fui um desses. Fizemos uma oposição bem presente, acompanhamos os principais desmandos que acabaram desaguando nessa confusão toda que aconteceu. E a gente estava avisando ó (estala os dedos), há muito tempo. E quando a gente ganhou essa eleição, eu estava em uma fase de carreira aqui no escritório que não conseguiria o tempo que o Botafogo merece para ocupar o cargo de vice jurídico. O Carlos Eduardo perguntou onde eu poderia ajudar. Falei: "Acho que posso ajudar no futebol porque já fui vice jurídico, conheço como funciona o regime dos contratos, me dou muito bem com o Aníbal (Rouxinol, advogado do clube)"... Eu acho que posso fazer isso, comandar o departamento jurídico dentro do futebol cuidando da parte disciplinar, que são os tribunais esportivos, a gente discute a estratégia e como fazer, e cuidar dos contratos com os jogadores. Revisar os contratos, tomar cuidado com certas questões... Ele concordou, achou uma ótima ideia, e estamos aí tentando ajudar.
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Estátua de Jairzinho no escritório de Gustavo Noronha Botafogo (Foto: Marcelo Baltar) |
PLANOS PARA O FUTURO NO BOTAFOGOPenso em continuar ajudando. Nunca fui um cara ligado a cargo. Sou plenamente realizado na vida pessoal e profissional, não sou do tipo que precisa de cargo para se achar importante. Tanto que não tive nenhuma dúvida quando entreguei a renúncia ao Maurício, e nem tive vaidade quando o Carlos Eduardo perguntou o que queria ser. Falei: "Carlos, não quero ser nada, quero te ajudar. Não seu preocupe se você vai me dar um cargo de vice-presidente, de diretor, de servente..." Não faço planos. Muita gente pergunta se eu almejo ser presidente do Botafogo um dia. É aquele negócio, um dia a gente sempre acha que é uma possibilidade (risos), de tentar ajudar mais, mas hoje, realmente, com o volume de trabalho que tenho aqui não tenho condição. Minha mulher, minha filha, meus sócios, todos me matam (risos). Para o futuro, a médio, longo prazo, não descartaria a possibilidade.
TRABALHO DOS SONHOS...Ao mesmo tempo é um sonho e um pesadelo. Quando a gente assumiu a gestão, sem brincadeira, não é politicagem ou coisa do gênero, mas eu vi uma criança na rua com a camisa do Botafogo e senti um peso nas costas. Botafogo na Segunda Divisão, a gente naquele momento meio que sem saber para onde ir, não tinha dinheiro, o clube estava devendo todo mundo, cheio de penhora, Ato Trabalhista suspenso... Passava por ela na rua, obviamente ela não sabia quem eu era, até hoje não sabem porque minha função é muito mais interna, e eu ficava pensando assim: "Olha o tamanho da responsabilidade". Esse é o pesadelo. A parte boa é você estar em contato, podendo ajudar, quando funciona é muito prazeroso. O Carli, por exemplo: briguei para trazer ele, deu aquela m**** na Argentina, falei que ia segurar aquele negócio. E o cara dá certo, torcida adora, performando super bem. Aí é o lado legal. Tem uma frase que o (Manoel) Renha (gerente geral da base) usou uma vez que é muito legal. Quando fomos campeões brasileiros sub-20, liguei para dar os parabéns e ele disse: "Gustavo, em um país onde tem tanta gente fazendo tanta coisa errada, a gente fazer as coisas de maneira séria, honesta, competente não pode dar errado. Isso ficou na minha cabeça. Estamos fazendo tudo com muito carinho, sem nenhum outro interesse que não seja do Botafogo. Espero que o Cara lá em cima olhe para essa turma e diga: "Esses não merecem dar errado" (risos).
PAIXÃO PELO BOTAFOGODe família, todo mundo. O meu pai, avô, bisavô... Tem até uma história curiosa. O Botafogo foi fundado por garotos que estudavam no Colégio Alfredo Gomes, e quando eles estavam combinando a fundação do Botafogo, trocavam bilhetes marcando encontros e tal, durante as aulas. Em um determinado momento, os livros do Botafogo contam esse episódio, um professor de álgebra interceptou um desses bilhetes. E esse professor era irmão do meu bisavô (risos). Ele (Júlio Cesar de Noronha) era General do Exército Brasileiro e foi dar aula depois que passou para a reserva. Aí tem a história e tem a lenda, né? Dizem que ele deu uma dura num primeiro momento, mas depois incentivou, apoiou, achou legal. Enfim, a família sempre esteve ligada ao clube desde o início. Meu avô era um torcedor fanático, de ouvir todos os jogos em um radinho verde de pilha. Meu pai hoje ajuda a gente na diretoria administrativa do clube e sempre foi fanático. Todos os meus aniversários sempre foram do Botafogo. Até hoje tem hino. Meu apelido nas peladas sempre foi “Botafogo” ou “Fogão”, porque em regra sempre jogo uniformizado. Eu tive uma infância em um período de jejum, então fui campeão pela primeira vez com 13 anos, aquele título sobre o Flamengo em 89. Estou com 40 agora. Mas até os 13 foi complicado. E lá em casa tinha fita cassete do Garrincha, Nilton Santos... Era a forma de cultivar a grandeza do clube, além, claro, de ir a todos os jogos que podíamos. Uma época muito complicada, em muito sustentada pela rivalidade nos clássicos, onde éramos competitivos até nos dias de chumbo.
Fonte: GE/Por Marcelo Baltar e Thiago Lima/Rio de Janeiro