Treinador afirma que deveria ter insistido por um outro 9 no Glorioso, elogia jovens alvinegros e destaca estrutura do Atlético-GO; interesse do Flu não se transforma em contato
Eduardo Barroca teve um ano para lá de intenso e surpreendente. Começou 2019 à frente do Corinthians na tradicional Copa São Paulo de Futebol Júnior e, em abril, assumiria o maior desafio de sua carreira: dirigir o time profissional do Botafogo, clube que deixara em 2018 após grande trabalho na base.
O início foi glorioso com um estilo corajoso e que prezava pelo domínio da bola. A oscilação e uma sequência de quatro derrotas no início do returno, porém, fizeram a diretoria interromper o trabalho. Mágoa? Nenhuma. O treinador obviamente queria permanecer, mas saiu com pessoas e o Botafogo no coração.
- Eu acredito muito no Botafogo. É um clube do cacete. Acredito muito na instituição e acho que consegui passar isso de alguma forma naquele momento tão difícil em que eu assumi.
Eduardo Barroca iniciou sua carreira de treinador de equipes profissionais no Botafogo — Foto: Vitor Silva/Botafogo
Barroca fez 27 dos 42 pontos somados (64% do total) pelo Botafogo no Campeonato Brasileiro, números fundamentais para escapar do rebaixamento. Mas conquista mesmo o carioca de 37 anos conseguiu no Atlético-GO. Assumiu às pressas o clube na reta final da Série B e conseguiu o acesso.
- Representou pra caramba. Fechei um ano onde comecei no Corinthians, passei pelo Botafogo e fechei no Atlético. Entendo que foi um ano muito especial na minha vida profissional. O que mais representou para mim foi poder retribuir a confiança do presidente. Um cara muito sério, que quer fazer as coisas corretas. Investe no clube, em estrutura e em base.
O bom trabalho na Série B fez o presidente do Dragão, Adson Batista, citar nominalmente o Fluminense como um dos interessados em contratar Eduardo Barroca. O nome dele é realmente muito bem avaliado nas Laranjeiras, tanto que houve uma sondagem após a saída de Oswaldo de Oliveira. Porém, mesmo com um relacionamento de pai para filho que tem com Paulo Angioni, diretor de futebol do Flu, Barroca garante que não houve contato até então.
Eduardo Barroca comemora acesso no Atlético-GO — Foto: Guilherme Gonçalves/GloboEsporte.com
- Não recebi nenhum contato do Fluminense, tenho ótima relação com as pessoas da direção, mas evidente que o Fluminense não me procurou estando brigando por uma Sul-Americana, que é uma coisa tão importante. O Fluminense tem um treinador e não procuraria ninguém nessa condição. E eu evidentemente não conversaria com nenhum clube que tenha treinador, ainda mais sabendo que o treinador é uma pessoa que respeito e com quem tenho relação.
- Falam muito da minha relação com o Paulo Angioni, que é muito próxima realmente. Trabalhei com ele em Bahia, Vasco e Fluminense, mas a gente quase não fala de futebol. A gente quase sempre fala de samba e Carnaval (risos). Há anos, a gente sempre assiste a todos os desfiles na frisa. A gente fala muito mais de samba do que futebol.
Barroca nos tempos de Fluminense próximo de Angioni e de Mário Bittencourt, então advogado do clube — Foto: Reprodução
Confira o bate-papo na íntegra com Eduardo Barroca:
Enfim de férias após três anos, Eduardo Barroca tirou a primeira sexta-feira de dezembro para passar a limpo o seu 2019.
- Barroca, como você avalia seu trabalho no Botafogo. Te satisfez?
Primeiro, fiquei muito feliz com a oportunidade de dirigir o Botafogo. Nos meus planos, o Botafogo era o clube perfeito para fazer essa transição da base para o profissional. Era um clube que eu conhecia e conhecia o corpo funcional e grande parte dos jogadores. Tinha um entendimento de como a torcida pensava e daquilo que ela tinha de expectativa.
"Se você me falasse assim: "escolhe um clube para começar". Esse clube, sem dúvidas, seria o Botafogo. Nunca deixo de falar: minha relação com o clube não é só profissional. É de gratidão, respeito e identificação também".
Iniciei o trabalho lá. Dividi o campeonato em quatro ciclos. Dos quatro, consegui participar de dois completos dentro do Campeonato Brasileiro, e o meu trabalho foi interrompido no terceiro. Sempre que se começa um trabalho, a gente quer que tenha início, meio e fim. Não conseguimos completar o trabalho, mas, dentro dos três ciclos em que trabalhei, o primeiro foi excelente, o segundo também foi muito bom e no terceiro, no início do turno, a gente não atingiu os objetivos. Principalmente os resultados, e o trabalho foi interrompido.
Saí muito satisfeito porque entendo que sempre acreditei num trabalho de construção. E entendo que dá para se fazer trabalho de construção em clubes grandes, como foi no Botafogo. A gente conseguiu vencer e pontuar com uma forma de jogar digna. Se não me engano, em duas ou no máximo três partidas, o adversário teve um domínio territorial acima da gente. Em quase 80% ou 90%, a gente dominou os adversários e controlou o jogo. Os jogadores acreditaram muito que era possível tentar jogar com o domínio do jogo seja contra quem fosse. Em casa ou fora.
Foi muito importante ter essa experiência. Como treinador, foi importante demais dirigir jogadores importantes, poder cobrar esse tipo de jogador e fazer as coisas andarem. Apesar de o trabalho não ter sido concluído, valeu muito a pena na minha linha de trabalho profissional.
- Quais foram seus grandes acertos e os maiores erros?
Sem dúvida alguma o maior acerto foi o fato de acreditar nos jogadores jovens do clube e acreditar nos atletas de uma forma geral. Quando cheguei, o momento não era nada bom, e a confiança estava muito baixa. Principalmente nesse primeiro momento consegui mostrar aos jogadores que eles seriam capazes de jogar um bom futebol no Campeonato Brasileiro.
Sempre acreditei muito nos jovens, e o Botafogo foi o clube que mais usou sua base no Campeonato Brasileiro. Eu usei, o Valentim continua usando. E usando muito bem com o objetivo principal do clube alcançado diante das dificuldades, que era se manter na primeira divisão.
"Eu acredito muito no Botafogo. É um clube do cacete. Acredito muito na instituição e acho que consegui passar isso de alguma forma naquele momento tão difícil em que eu assumi".
Sem dúvida acreditar nos jovens, dar oportunidade a eles. Acreditar numa forma protagonista de jogar, com coragem. Mesmo quando tivemos algumas dificuldades de agressividade e ofensividade, nunca abrimos mão de jogar tentando o protagonismo, nunca jogamos por uma bola.
Esse tipo de jogo valoriza o jogador e o faz se sentir bem. E a gente conseguiu fazer isso junto com bons resultados. Quando saí, o Botafogo estava na zona da classificação para a Sul-Americana, no 12º lugar. Figurou quase que um turno inteiro na primeira parte, em muitos momentos na zona da Libertadores. Isso foi motivo de muito orgulho.
Pequenas coisas eu teria feito diferente, como escolhas, substituições. Mas sem dúvida alguma na minha chegada eu teria brigado um pouco mais para que a gente tivesse outras opções mais experientes, principalmente no ataque. Acho que em alguns momentos faltou uma competição interna maior no nosso ataque. Desde o início sempre pedi um centroavante, porque entendia que Diego Souza poderia jogar como segundo atacante ou como um meia.
Eu cometi diversos erros, acho que é muito importante ter a humildade de reconhecer que diversas situações eu faria diferente. Escolhas, substituições, formas de jogar, mas isso aí é o que amadurece o profissional. Queria destacar os diversos erros que cometi.
- Se decepcionou com alguém dentro do clube? Se sim, poderia citá-los?
Pelo contrário. A minha chegada, o desenvolvimento do meu trabalho e a minha saída foram feitas da melhor maneira possível, sempre de forma correta e frontal. Tenho muito carinho e respeito pela direção do clube. Com o Anderson Barros, nem se fala. Foi a pessoa que deu todo o suporte para o meu trabalho. Tenho gratidão e o valorizo muito. É um cara extremamente importante nesse ano do Botafogo, segurou muita coisa na unha, como a gente costuma dizer no futebol. Tenho maior respeito e carinho pela turma da direção. E eles comigo.
- Achou errada a decisão de a diretoria interromper o trabalho no início do returno?
Quando se começa um trabalho, a gente tem sempre a expectativa de iniciar e terminar. Quando eu vim para o Botafogo, por ser jovem, tinha certeza que eu não poderia permitir sequências de resultados sem vencer porque isso me traria problemas.
Sempre tive essa ciência, tanto que, em minhas primeiras falas, meu objetivo inicial era conseguir resultados a curto prazo. A gente passou um período sem vencer, e isso ocasionou a interrupção do trabalho.
Se você pegar a sequência desses jogos, jogamos muito bem contra o São Paulo e sofremos o gol nos acréscimos. Depois a gente sai atrás contra o Bahia, e o Gilson é expulso no primeiro tempo num jogo muito difícil. O Bahia vivia grande momento, e, com a expulsão, a gente praticamente não teve possibilidade de reverter.
Fomos a Fortaleza, fizemos um jogo equilibrado e perdemos de 1 a 0 num gol contra. Depois um jogo com o Fluminense em casa, onde também tivemos boas oportunidades. Sofremos um gol, tivemos que correr atrás na maior parte do segundo tempo.
Mas em nenhum momento perdemos jogos por dois ou três gols de diferença, foram sempre partidas equilibradas.
"Evidente que gostaria de ter permanecido, acreditava muito em reverter essa situação, tanto que o Botafogo acabou revertendo. E tenho que falar também dos méritos do Alberto".
Alberto é muito respeitado por todo mundo, conhece o clube e um cara que foi muito importante para o objetivo do Botafogo ser alcançado. Isso tem que ser valorizado.
"Tenho o maior orgulho em encher a minha boca e falar que talvez fui o treinador mais jovem da história a dirigir o profissional do Botafogo".
- Quais as pessoas que levará no coração do Botafogo?
Tenho muita gratidão à direção, que apostou no meu trabalho, mesmo eu sendo um treinador jovem e que não trabalhava no futebol profissional.
Tenho uma gratidão enorme ao Manoel Renha, que foi a pessoa que me deu oportunidade na base e que sempre foi um parceiro. Ao Anderson Barros, a pessoa que diretamente escolheu o meu nome e que deu suporte ao meu trabalho todo.
Gratidão à toda a comissão técnica, trabalharam incessantemente, e eles têm um mérito muito grande nessa permanência. O Botafogo tem um corpo de trabalho muito digno, de ótimo nível.
E aos jogadores. Comigo sempre se dedicaram, acho que todo mundo sabe o que aconteceu depois do jogo com o Fluminense. Jogadores tiveram uma manifestação que é muito difícil de acontecer nos dias de hoje. Poucas pessoas sabem dos detalhes daquele episódio, mas volto a falar que guardarei sempre no meu coração a atitude que os jogadores tiveram comigo.
Eduardo Barroca deixou o Botafogo após derrota para o Fluminense — Foto: André Durão/GloboEsporte.com
Atlético-GO
- O que te motivou aceitar um trabalho na Série B pouco depois de deixar o Botafogo?
Um dia depois que saí do Botafogo recebi o convite de um time da Série A e outro da Série B. Eu recusei porque realmente meu objetivo não era mais trabalhar em 2019, tinha questões familiares pendentes e precisava colocar minha vida em dia.
Eu vinha emendando um trabalho em cima de outro desde 2016 e era convocado no meu período de férias em seleções de base. Não tinha férias há mais de três anos.
Saí do Botafogo num domingo, minha esposa marcou o batizado do meu filho para o outro domingo e falou: "Você não tem domingo, vamos marcar logo domingo porque é mais seguro (risos)". Garoto já ia fazer 2 anos e não tinha sido batizado.
Na hora do batizado do meu filho, meu telefone tocou. Era o presidente do Atlético-GO, pessoa por quem já tinha respeito profissional grande. Destrinchou tudo aquilo que pensava para a reta final da Série B. Eram nove jogos em 45 dias.
Lá atrás vi uma entrevista do Mano Menezes ele contando que a escolha dele pelo Corinthians quando saiu do Grêmio teve uma lógica. A importância de um treinador consolidar o resultado no segundo trabalho dele.
Fala que na época tinha o Cruzeiro e o Corinthians, e ele entendeu que com o Corinthians poderia consolidar o trabalho. Mesmo não tendo plano de trabalhar em 2019, eu entendia que era uma oportunidade muito boa para mim em termos de consolidar um trabalho. Nunca tinha trabalhado na Série B, e eu entendia que valeria muito a pena viver essa experiência num clube extremamente organizado, que dá ótimas condições de trabalho e numa equipe que lutava pelo acesso. Resolvi não deixar passar essa oportunidade, entrei de cabeça no projeto. Fiquei 45 dias morando no CT do Atlético, que por sinal é um CT de muita qualidade. Deixei minha família no Rio, fui de cabeça, e a gente acabou coroado com o objetivo alcançado, e foi muito legal.
- Imaginou que poderia ser um passo atrás?
Em nenhum momento achei que seria passo atrás. Única coisa com que preocupei foi de não ter me preparado adequadamente para assumir o desafio, porque entendo que é sempre importante entre um trabalho e outro o treinador dar uma desafogada de 15 a 30 dias. Para que ele mude a chave para um novo trabalho e numa competição que eu não conhecia tanto.
Mas foi muito boa a experiência, tive a oportunidade de trabalhar praticamente em 10 jogos. Pude assistir a um in loco e trabalhei diretamente em outros nove. Basicamente pude ver in loco mais 130 jogadores, conheci a característica da competição, conheci o grupo todo com o qual trabalhei no Atlético. Isso aí vai ser muito importante na minha vida profissional.
Meu único receio era não ter me preparado tão bem para esse segundo desafio. Recebi o convite e já viajei no dia seguinte para assumir a equipe. Não tenho esse hábito, mas no final deu tudo certo.
- O que representou o acesso para você?
Representou pra caramba. Fechei um ano onde comecei no Corinthians, passei pelo Botafogo e fechei no Atlético. Entendo que foi um ano muito especial na minha vida profissional.
Trabalhei no Corinthians em uma competição que é muito importante para o clube. Fizemos uma belíssima competição, saímos invictos na semifinal e perdemos no pênalti. O trabalho no Botafogo também foi muito bom, com bons resultados e ótima experiência.
E fechar com o objetivo alcançado no Atlético-GO foi muito importante para mim. O que mais representou para mim foi poder retribuir a confiança do presidente. Um cara muito sério, que quer fazer as coisas corretas. Investe no clube, em estrutura e em base. O Atlético tem uma estrutura top no Brasil, e a minha responsabilidade era muito grande de retribuir essa confiança. Quando consolidamos o acesso, o sentimento de prazer e alívio por ter correspondido a essa expectativa foi muito grande.
- Por que quis voltar ao Rio (já sei a resposta, mas acho que vale repetir)?
O presidente tinha uma necessidade muito grande de montar um planejamento desde o término da Série B, e eu tinha umas pendências familiares. Estava há 45 dias sem ver meus filhos, e eu precisava desse final de ano para fazer a Licença Pro da CBF em dezembro. Eu tinha algumas compromissos e não poderia assumir esse de já iniciar esse processo. Então optei por resolver essas pequenas pendências para retomar no ano de 2020 da melhor maneira possível.
Fluminense
- Barroca, seu nome agrada ao Fluminense e até o presidente do Atlético-GO citou o Tricolor como um dos possíveis times que teriam interesse em seu trabalho. Houve algum contato do Flu?
Não recebi nenhum contato do Fluminense, tenho ótima relação com as pessoas da direção, mas evidente que o Fluminense não me procurou estando brigando por uma Sul-Americana, que é uma coisa tão importante. O Fluminense tem um treinador e não procuraria ninguém nessa condição. E eu evidentemente não conversaria com nenhum clube que tenha treinador, ainda mais sabendo que o treinador é uma pessoa que respeito e com quem tenho relação.
Falam muito da minha relação com o Paulo Angioni, que é muito próxima realmente. Trabalhei com ele em Bahia, Vasco e Fluminense, mas a gente quase não fala de futebol. A gente quase sempre fala de samba e Carnaval (risos). Há anos, a gente sempre assiste a todos os desfiles na frisa. A gente fala muito mais de samba do que futebol.
Fonte: GE/Por Fred Gomes — Rio de Janeiro
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