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quarta-feira, 14 de junho de 2023

Recusa ao Flamengo, Seleção e contato com raízes: a história de Tiquinho Soares até o Botafogo



Artilheiro do Campeonato Brasileiro e referência do líder, camisa 9 foi descoberto por projeto no interior da Paraíba, chegou a ser testado como goleiro e explodiu em Portugal



Da pequena Sousa, no interior do estado da Paraíba, cidade de 842 km² e 69 mil habitantes, distante 435 km da capital João Pessoa, até o brilho no Rio de Janeiro defendendo a camisa do Botafogo, o caminho do centroavante Tiquinho Soares foi longo, passando por Europa e Ásia, lidando com lesões, uma pandemia em meio à chegada na China, quase convocação para a Seleção Brasileira e uma recusa ao rival Flamengo.



Confira os gols de Tiquinho Soares no Brasileirão 2023 (https://ge.globo.com/video/confira-os-gols-de-tiquinho-soares-no-brasileirao-2023-11696973.ghtml)



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Hoje artilheiro do Campeonato Brasileiro com 8 gols em 9 jogos, grande destaque do Glorioso, que lidera a competição com 24 pontos somados em 30 possíveis, Soares começou a dar os primeiros passos no futebol no Centro Recreativo Angelim (CRA), um projeto do bairro onde morava em Sousa.


- Desde novinho ele tinha características de um menino que a gente acreditava que teria um futuro promissor. Aqui ele sempre jogou de atacante, tinha passada larga, protegia bem a bola. Já tinha potencial para ser um grande jogador - lembrou Nildo Lima, coordenador do CRA que conheceu o atacante quando ele tinha nove anos de idade.


Em busca de mais oportunidades de emprego, os pais de Tiquinho, Seu Nilton e Dona Socorro, se mudaram para Natal. Por lá, o centroavante seguiu em busca do sonho do futebol, treinando na base alguns clubes, entre eles o América-RN, e até em outras posições.


- Ele sempre foi grandão, aqui sempre jogou de atacante. Quando ele foi morar em Natal, algumas pessoas começaram a querer botar ele de goleiro, mas comigo ele sempre foi atacante - contou Nildo.


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Nildo Lima ao lado de Tiquinho Soares na base do América-RN — Foto: Arquivo pessoal



No América, Tiquinho assinou o primeiro contrato profissional, foi emprestado algumas vezes, fez a estreia no time principal, mas não permaneceu. Depois de ter o acordo rescindido, o Centro Sportivo Paraibano (CSP), em João Pessoa, lhe abriu as portas para seguir carreira.


- Ele foi emprestado e, quando voltou, o América rescindiu com ele. Tem um amigo meu que ajudou a revelar ele e falou comigo. Conversei com o Soares, fiz a proposta e ele achou pouco. Eu falei pra ele vir que, se atingisse o nível que eu esperava, aumentaria o valor. Ele ficou resistente, mas acabou vindo e se destacou aqui - afirmou Josivaldo Alves, um dos donos e treinador do CSP.


"Ele ficou uns dias parado, teve que entregar a casa que morava. Já era casado, tinha esposa e um filho novinho. Quando veio pra cá, passou a receber certinho em dia e ganhar prêmio, aí pôde alugar uma casa nova", completou Josivaldo.


Foram três temporadas no CSP sempre sendo emprestado para ter oportunidade disputar outros campeonatos. Apenas em 2012 o centroavante disputou a Copa Paraíba inteira com o time e foi o destaque. Depois de passar por Veranópolis, Pelotas e Lucena, Tiquinho foi para o Nacional da Ilha da Madeira, em Portugal, onde começou a construir uma carreira de sucesso na Europa.



O bom rendimento no Nacional chamou atenção do Vitória de Guimarães, que comprou os direitos de Tiquinho Soares do CSP. Após meia temporada no Vitória, foi comprado pelo Porto, onde de fato explodiu e construiu a reputação no continente europeu.



Quase convocação por Tite e recusa ao Flamengo

Soares teve começo avassalador nos Dragões. Foram 12 gols marcados nas primeiras 17 partidas. O destaque em Portugal aproximou Tiquinho Soares da Seleção Brasileira, à época comandada por Tite, chegando inclusive a ser observado pelo auxiliar técnico Cléber Xavier, em 2019, mas as lesões o afastaram da amarelinha.


- O treinador, Sérgio Conceição, conversando com ele disse que ele deveria jogar com um peso um pouquinho abaixo do que estava, mas acabou lesionando ao baixar esse peso. Uma lesão quase grau 3, quando voltou, não foi o mesmo, acabou machucando de novo. Quando ele voltou a estar normal, o Abubakar já estava muito bem lá, era o titular. Ele sempre era utilizado, mas já não era do mesmo jeito.


"Ele se incomodou porque pediram pra baixar o peso e isso acabou tirando ele de ritmo. Ele já estava sendo sondado pela Seleção Brasileira, o Cléber Xavier tinha conversado com ele e colocado na pré-lista", afirmou Josivaldo.




Tiquinho Soares comemora título da Taça de Portugal no último sábado — Foto: Divulgação/FC Porto


Em 2020, recebeu proposta irrecusável do Tianjin Teda, da China, mas na Ásia conviveu com atrasos de pagamento e a pandemia da Covid-19, que o obrigou a ficar trancado no hotel por 20 dias antes de se apresentar. Após acordo, deixou o país asiático e buscou nova oportunidade. Nesse período, chegou a ser procurado por um representante do Flamengo, garante Josivaldo.


- Ele chegou a ser procurado por alguém do Flamengo, mas falou que não queria vir pro Brasil naquele momento. Quem cuida [da carreira dele] é o Deco, mas eu sempre opinei. Deixo ele decidir, mas dou minha opinião. Respeito a decisão dele, é claro - lembrou o ex-treinador e amigo.


Ligação com as raízes

Mesmo ao longo de muitos anos na Europa e na Ásia, Tiquinho Soares nunca se desligou das raízes no interior da Paraíba. Sempre que tem um período de férias ou folga, o atacante volta a Sousa para encontrar com os amigos, jogar uma pelada, pescar e também conversar com os jovens do CRA.


- De todos os clubes que ele defendeu na Europa, ele traz camisa pra mim e vem visitar o projeto. Conversa com as crianças para dar uma palavra de motivação. Sempre que ele esta de férias vem aqui em Sousa para se reunir com os amigos de infância. Tem aquela brincadeira, descontração, uma peladinha.

Ele sempre volta à casa, jamais esquece as origens. Ele é reservado, não gosta de aparecer, mas sempre que procuramos ele pra ajudar, tanto no projeto, quanto as pessoas aqui no bairro, ele ajuda
— Nildo Lima


Avesso a dar entrevistas, o atacante se mostra uma pessoa muito reservada, mas não perto dos amigos, é o que garante Josivaldo. Além de brincalhão, o ex-treinador e amigo destaca outra característica do camisa 9 alvinegro.


- Ele é meio pão duro (risos). É uma qualidade boa, ele não joga fora o que ganha, valoriza. Sabe a dificuldade que passou e não quer passar de novo. É um cara muito tranquilo. Fora de campo ele é muito família. Tem uns amigos mais reservados. Quem é amigo, é amigo mesmo. Nas férias, ele vem aqui, vai no campo da gente, treina no meio da gurizada - destacou Alves.




Tiquinho treinando no CSP após rescindir com o Tianjin Teda, da China — Foto: Arquivo pessoal



Brilho no Botafogo e chance de Seleção

Após uma temporada no Olympiacos, da Grécia, Tiquinho Soares recebeu a oferta do Botafogo para voltar ao Brasil e ser a referência de ataque do time comandado por Luís Castro, a quem conheceu quando jogou em Portugal.


- Nessa situação do Botafogo, eu fui lá na Grécia e ele aceitou logo. Eu falei: "Eu iria para o Brasil porque o pessoal não te conhece. Você tem que jogar em um grande clube do Brasil para mostrar a todo mundo do seu país o quanto você joga. Não é todo mundo que tem acesso aos jogos internacionais. Seria uma oportunidade boa de você mostrar seu talento. O dinheiro é legal. Eu iria para o Brasil". Ele aceitou e hoje é um sucesso - recordou Josivaldo.


- Estou muito feliz por esse momento. Nós, que conhecemos a história dele, de um menino sofredor, sonhador, que chegou aonde chegou. Eu falei com ele que agora é o momento dele. Ele é muito conhecido na Europa e agora é o momento de ele mostrar no Brasil a grandeza dele. O Botafogo abraçou, trouxe ele de volta para o Brasil e está mostrando o potencial. Faltava mostrar aqui no Brasil quem realmente é o Tiquinho Soares. Um matador, excelente atleta fora e dentro do campo. Estamos muito felizes porque ele chegou onde queria e merece. Nada melhor do que ser o artilheiro do Campeonato Brasileiro com tantas estrelas na disputa como Hulk, Pedro e Gabigol - completou Nildo.




Tiquinho Soares comemora gol contra o Fortaleza — Foto: Marcelo de Jesus 



Mesmo com 32 anos, ter a primeira chance na Seleção Brasileira não é algo impossível para Tiquinho, pelo menos é o que garantem os ex-treinadores e amigos do artilheiro do Campeonato Brasileiro até aqui.


- É o camisa 9 que o Brasil precisa no momento. Ele disse que se acontecer vai ser o maior presente da vida, mas ele é consciente que já tem 32 anos. No momento que estava bem no Porto a gente torceu para ele ser convocado, mas infelizmente ele não foi. O momento é dele, é o artilheiro do Brasileiro. Ele merece ser convocado - afirmou Lima.


Soares tem domínio, tem velocidade, mesmo não sendo um guri, chuta com as duas pernas. É um centroavante completo. O único que vejo no patamar dele no Brasil é o Pedro. Eu acho que ele é um jogador diferente
— Josivaldo Alves


Se na Seleção o momento de Tiquinho Soares ainda não chegou, no coração do torcedor alvinegro o atacante vai ganhando cada vez mais espaço e se consolidando como uma referência de um novo momento na história do Botafogo. A cada gol, cada assistência, o camisa 9 escreve uma nova pagina no roteiro de um ídolo e o volume da música entoada no Nilton Santos sobe: "Tiquinho Soares é f***".


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Fonte: GE/Por Giba Perez — Rio de Janeiro