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domingo, 11 de novembro de 2012

Jorge Sampaoli: 'Gostaria de poder implementar meu trabalho no Brasil'


Em entrevista ao L!, técnico argentino que revolucionou a Universidad de Chile, e conquistou quatro títulos em dois anos, conta que quer treinar um clube brasileiro em 2013





A lembrança mais recente da Universidad de Chile para o brasileiro é certamente a pesada derrota por 5 a 0, para o São Paulo, no Pacaembu, na última quarta-feira. No ano passado, porém, com um time mais forte e um método de trabalho revolucionário, o clube conquistou o troféu da Sul-Americana de forma invicta. O responsável pela transformação da La U é o técnico argentino Jorge Sampaoli, que assumiu no início de 2011. Em menos de dois anos no cargo, ele venceu quatro títulos, e deu ao clube seu primeiro troféu internacional. Para 2013, o objetivo de Sampaoli é treinar um clube brasileiro.

Nesta semana, enquanto La U esteve na capital paulista para o jogo das quartas de final da Sul-Americana, Jorge Sampaoli recebeu a reportagem do LANCENET!, e contou que já não vê mais objetivos para permanecer no clube chileno. Ele tem contrato até o fim de 2013, mas pretende sair no fim do ano pois entende que o elenco não é competitivo como o de 2011.

Sampaoli conhece em profundidade as melhores equipes brasileiras. Tem opinião forte sobre cada estilo de jogo, e conhece as características de todos os jogadores. A obsessão pela observação dos adversários marca o metódico e detalhista Jorge Sampaoli que, antes de cada jogo, prepara uma conversa individual com cada atleta, com vídeos e instruções sobre o adversário.
O argentino recebeu convites para treinar clubes do país natal e interessa à seleção chilena, mas só vê com bons olhos, agora, a ideia de trabalhar no Brasil. Confira a entrevista com Jorge Sampaoli, sensação na América do Sul.
LANCENET!: Na maioria das vezes em que um técnico é demitido em um grande clube do Brasil, seu nome é cogitado. Sente o trabalho reconhecido aqui?
Jorge Sampaoli: Sim, ainda mais por ser em um país que não é meu. O reconhecimento no Brasil, um país com muita tradição no futebol, me enche de orgulho. Sendo um argentino, que trabalha no Chile, ter tanta aceitação popular aqui (Brasil) é muito importante para mim.

L!: La U não é a mesma do ano passado. Acha que pode voltar a jogar o que jogou?
JS: É determinante a qualidade de jogadores. Aqui, contra o Santos na final da Recopa, quando tivemos a capacidade de dominá-los, não tivemos a competência de fazer gols. Aí apareceu Neymar, e para eles facilitou muito. Tem a ver muito com a convicção e a característica de jogadores que te permitam que, em um momento de domínio, convertam em gols. La U com o título da Sul-Americana foi algo que só poderá ser repetido no futuro daqui a anos, é muito difícil. Você tem que saber em que mercado está e que possibilidades futuras internacionais você tem.

L!: Diante desse quadro, tem vontade de continuar no clube?
JS: Tenho contrato até 2013, mas tenho uma cláusula de saída. O que acontece é que La U se acostumou a ganhar, mas o time se encontra cada vez mais deteriorado. Em cada campeonato se vão dois ou três dos melhores jogadores. E assim se foram sete dos melhores, é cada vez mais difícil. Nesse quadro, o mais conveniente, se não formarmos um bom elenco, seria sair.

L!: No fim deste ano, já?
JS: Claro...
L!: Acredita que poderia implementar seu método de trabalho no Brasil? Teme a resistência?
JS: Sim, é uma motivação especial, porque primeiro há de se adaptar à peculiaridade do jogador de onde vou treinar. Tem que comovê-lo, tentar fazer com que ele respeite a ideia. Inicialmente, tem de respeitar muito o escudo, a camisa. Quando joga por amor à camisa é muito mais fácil. Depois, lutar para que o jogador se convença do projeto e que goste de você. Há jogadores que aderem rápido, jogadores que demoram um pouco mais e jogadores que nunca aderem. Essa metodologia de explicar todos os dias que o escudo e a camisa do clube são o mais importante gera uma aproximação com os jogadores do elenco.

L!: Você teve uma proposta do Cruzeiro em maio, e seu nome continua cogitado. Aceitaria vir?
JS: Não depende só de mim. Mas sempre tenho a ilusão de que, com tudo o que se tem falado, tenha a chance de treinar uma equipe brasileira. Gostaria de poder implementar meu trabalho, ser um dos técnicos estrangeiros que possa gerar algo diferente no país. Disse não ao Cruzeiro pois estava no meio de um torneio. Agora a situação mudou. Não sei se o Cruzeiro ainda tem intenção de me contratar, mas gostaria muito de participar do Campeonato Brasileiro, está entre os melhores do mundo.

L!: O que te atrai mais no futebol brasileiro? Por que vê o cenário como tão favorável?
JS: Os jogadores, mais ainda os jogadores jovens. Tem uma gama de jogadores jovens que poderiam ser trabalhados e que seriam aqueles que poderiam fazer uma transformação. É muito difícil que jogadores grandes, consagrados, possam gerar alguma grande mudança.

L!: O que La U fez de diferente para chegar aonde chegou?
JS: Foi demonstrar que nada é impossível, com a possibilidade de ter uma equipe que trate de ser protagonista com menos hierarquia, com menos argumentos individuais. Passamos a um funcionamento coletivo que permitiu equiparar com aqueles jogadores que realmente estão consolidados no tempo. Então é jogar pressionando, com intensidade, jogar com um time extremamente curto. Tentar jogar de uma maneira que possamos atuar de igual para igual com os rivais.

L!: Você nunca treinou na Argentina. Já recebeu propostas de clubes de lá?
JS: Tive convite do San Lorenzo agora, do Newell's antes. Mas não tenho muita vontade de treinar na Argentina. Há uma crise no futebol de lá, hoje me parece que cada vez se joga pior e o nível está muito baixo.
L!: Teve convite para treinar o Chile? Tem vontade?
JS: Não, apenas se falou, mas diretamente não houve nada concreto. Não sei, não sei. Porque é totalmente diferente treinar uma seleção. Me agrada muito mais o dia a dia, ainda que a seleção tenha compromissos importantes pela frente como o Mundial, então teria que avaliar. Mas hoje estou muito satisfeito dirigindo clubes.

L!: Você é muito detalhista. Por que a obsessão pelo estudo de cada jogador, dos adversários?
JS: Porque acredito que futebol tem a ver com isso. Tem a ver com a forma de jogar do adversário. Mandamos gente para observar os treinos dos adversários. Ficamos de olho em quem está lesionado, em quem não está. Temos uma equipe que edita vídeos de cada momento dos rivais, dos nossos momentos. Tudo isso ajuda muito a conhecer quem vamos enfrentar.

L!: E antes dos jogos, como é o seu planejamento? O que é feito na preparação do elenco?
JS: Na tarde anterior fazemos um vídeo geral do jogo que disputamos anteriormente, com acertos e erros. À noite fazemos vídeos individuais, com os momentos de cada jogador do jogo no Chile. Cada um tem seus minutos em campo separados em um CD, e cada jogador recebe o seu. Aí sentamos, compartilhamos e debatemos as circunstâncias de acertos e erros. Pela manhã vemos a equipe rival, cada minuto de cada jogador do time rival. Paramos e mostramos as características de quem vamos enfrentar, e o sistema de jogo também. E antes do jogo, montamos uma apresentação final que mostramos como vamos defender, como vamos atacar, a bola parada, como vamos nos aproveitar e nos defender da bola parada.

L!: Fora os jogos que vê para se preparar, quais times assiste?
JS: Hoje, com a quantidade de trabalho que temos, não conseguimos ver tanta coisa por gosto pessoal. Queria poder assistir ao Barcelona, ao Real Madrid ou ver mais o Fluminense, que é o melhor time do Brasil. Tenho esses jogos gravados, mas não consigo ver. Só assisto aos nossos próximos rivais. Assim, aprendi muito sobre o futebol brasileiro, assisti a 15 partidas de cada um e observei muitos atletas.

L!: Quais equipes do Brasil você destaca? Como vê os estilos?
JS: Fluminense e Corinthians, que têm diferentes estilos. O Corinthians é uma equipe grande, que ganhou a Libertadores e, por isso, ganhou respeito, mas não me agrada o estilo de jogo. O Fluminense tem jogadores de muita qualidade, não à toa estão no lugar em que estão no futebol brasileiro. É um time que cria muito mais oportunidades que seus rivais. E tem o São Paulo, que é uma mistura de tudo isso. Mas é um time que deveria estar em um patamar mais alto. Tem muitos bons jogadores. Trouxe Ganso, tem Jadson na criação, Denilson, Osvaldo pelos lados, Lucas, Luis Fabiano, e (Willian) José, que entrou outro dia e tem muito futuro. É impensável que a LDU de Loja tenha empatado dois jogos com o São Paulo. Mas não tem a ver com a LDU de Loja, mas sim com o São Paulo...

L!: Quais problemas você vê no esquema de jogo do São Paulo?
JS: Sem (Paulo) Miranda, que controla mais a marcação do lado direito, Douglas ataca, Cortez ataca, sobrecarregando e expondo demais Toloi e Rhodolfo. No Chile, aproveitamos muito as costas de Cortez.
Mas Wellington é um jogador que se destaca muito, porque corrige um monte de coisas.. Porque tanto o Denilson como Maicon são jogadores para levar mais o time à frente. Ele tem muita velocidade, uma variação de ritmo, uma recuperação que não havia em nenhum jogador do Brasil. É um volante de contenção completíssimo.

L!: Como vê, no geral, o estilo atual do futebol brasileiro?
JS: Equipes brasileiras atacavam muito mais antigamente. Corinthians acaba ganhando porque é sólido defensivamente, pois ataca muito pouco. Nossa ideia é só uma: ter o protagonismo absoluto.

Argentino trabalha com estafe brasileiro

Apesar de ainda não ter trabalhado em um clube brasileiro, Jorge Sampaoli atualmente é agenciado pelo ex-jogador brasileiro Gélson Baresi, que atuou no início dos anos 1990 pelo Flamengo, e hoje atua como empresário. A aproximação do técnico argentino com os brasileiros aconteceu justamente para facilitar o ingresso no país, para que seus intermediários estejam mais próximos dos clubes que pretende treinar.

Após as conversas com o Cruzeiro, no fim do primeiro semestre, o estafe brasileiro de Sampaoli mantém contato com os clubes do país e tenta encontrar alvos para o ano que vem. Treinador e agente acreditam que os clubes do sul, como Internacional e Grêmio, seriam os melhores destinos para que pudessem implementar o diferente método de trabalho. Nestes clubes, aguardam as mudanças que podem acontecer com as eleições presidenciais neste fim de ano, para saber se haverá interesse em contar com o argentino.
Quem administra a carreira do treinador também gere com cuidado a inserção de Sampaoli no Brasil.

Sabem que, caso o argentino chegue a um clube sem uma diretoria sólida e um elenco aberto a novos métodos de trabalho, pode ser queimado na primeira chance que tiver no país. Não por incompetência, mas sim por não ter respaldo do clube para levar a diante a forma de trabalho individualizada, com conversa e análise.

Por enquanto, não há propostas formais de clubes brasileiros para 2013, mas há conversas. Caso a diretoria da Universidad de Chile não mostre a Jorge Sampaoli que pode disputar a Libertadores com um time competitivo no ano que vem, ou até mesmo a Sul-Americana, ele não vai permanecer no clube e, livre, certamente intensificará as tentativas para entrar no mercado brasileiro.

Quem é

Nome: Jorge Luis Sampaoli Moya
Nascimento: 13/3/1960 (52 anos), em Casilda, na Argentina.
Como jogador: Aos 19 anos, no Newell's, deixou os gramados por conta de uma lesão na tíbia.
Clubes que treinou: 2002: Juan Aurich (PER); 2002 a 2003: Sport Boys (PER); 2004 a 2006: Coronel Bolognesi (PER); 2007: Sporting Cristal; 2008 a 2009: O'Higgins (CHI); 2009 a 2010: Emelec (ECU); 2011 até presente: Universidad de Chile (CHI).
Títulos: Chileno 2011 (Apertura e Clausura), Chileno 2012 (Apertura) e Copa Sul-Americana 2011.


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