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quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Quarteto demitido do Botafogo explica a saída e faz duras críticas a presidente



Sheik, Edilson, Bolívar e Julio Cesar falam em estrutura deficiente, como falta de remédios, e tacham mandatário Maurício Assumpção de o "pior" que conheceram



O quarteto demitido pelo presidente do Botafogo, Maurício Assumpção, no início de outubro falou pela primeira vez com a imprensa. Na tarde desta quarta-feira, no restaurante Paris 6, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Emerson, Bolívar, Edilson e Julio Cesar rebateram o discurso do mandatário, que justificou a dispensa dos jogadores dizendo que o comportamento de cada um deles não era condizente com a postura que esperava de atletas experientes diante do restante do elenco. Unânimes, os jogadores disseram que o mandatário alvinegro foi o pior com o qual já trabalharam.

A DEMISSÃO
Sheik conta como soube da demissão do Botafogo

ASSUMPÇÃO
Sheik sobre o cartola: "Não lembro dele como nada no futebol"

CRÍTICA

Emerson diz que tem gente que "passa fome" no Botafogo

Segundo o dirigente, os quatro exerciam uma liderança negativa num clube cuja situação financeira é muito delicada – são sete meses de direitos de imagem atrasados, e o Alvinegro conseguiu esta semana verba para pagar um dos três meses devidos na CLT, evitando assim que jogadores entrem na Justiça pedindo a rescisão. O dinheiro, que também ajudará destinado a funcionários, só foi conseguido graças a uma nova ação do Sindiclubes (sindicato de funcionários de clubes de futebol) junto ao Tribunal Regional do Trabalho.

– Estamos aqui para dar o nosso depoimento, para esclarecer tudo aquilo que, para nós, não teve explicação. Até hoje estamos querendo saber o porquê de os quatro estarem fora do Botafogo. Estamos aqui para esclarecer tudo – disse Bolívar, o primeiro a falar, explicando por que os quatro se uniram para a coletiva.

Procurada pela reportagem do GloboEsporte.com, a assessoria do Botafogo informou que o clube não irá se pronunciar sobre as declarações de seus ex-jogadores.

Edilson, Emerson Sheik, Bolívar e Julio Cesar durante coletiva para falar da rescisão com o Botafogo(Foto: André Durão)




Satisfeito com a presença efetiva da imprensa – "Está lotado hoje, né? Eu gosto assim (risos). Fico empolgado" – contou como foi avisado de que estava fora do Botafogo.

– Estava jantando com um amigo, peguei o telefone quase às duas da manhã e vi que o Julio Cesar tinha me ligado. Fiquei preocupado, achando que tivesse acontecido alguma coisa. Mesmo tarde, liguei de volta, e ele falou que estávamos afastados. Achei que fosse alguma brincadeira, mas ele foi muito sério na hora de dar a notícia. A princípio, era um afastamento. Ainda assim, pediram para que fôssemos ao treinamento no dia seguinte. Mas até hoje, talvez essa seja a grande pergunta: por que tudo isso aconteceu? Uma preocupação nossa, coletiva, foi o que isso poderia gerar. Cada um tem uma história dentro do futebol, e nossas histórias não foram respeitadas. Fiquei preocupado com o Botafogo dentro da competição. Mas também me preocupei com as nossas histórias no futebol. A história do presidente é muito inferior a nossa. O motivo, só ele pode responder – contou Emerson.

Confira o que cada jogador falou na coletiva:

MAURÍCIO ASSUMPÇÃO

Julio Cesar – "Ele é o presidente. Tem todo o direito de mandar embora quem quiser, mas tem também que assumir as responsabilidades. Antes de mandar embora, tem que acertar, tem de arcar com o custo das rescisões. Ele vai passar isso para a próxima diretoria, está tentando parcelar e passar para a próxima diretoria, mas tem que ser homem e assumir tudo. Eu não sei por que fui mandado embora."

Bolívar – "Apunhalado é um bom termo. Não pelo Botafogo, e sim por ele. Não tenho arrependimentos pelo clube. Ano passado fizemos uma campanha brilhante, conseguimos levar o Botafogo à Libertadores depois de muito tempo, mas (disputou a competição) com toda a situação de salário atrasado. Mesmo depois de muito tempo. Ficamos tristes pela situação, pelo desrespeito que tiveram com nós quatro. Seria muito mais simples o presidente nos chamar para conversar, mas infelizmente não foi dessa maneira. Nós sempre falamos que a palavra do homem é muito mais importante."

Emerson – "Vai continuar papo de maluco. Ninguém entende nada. Não tem o que falar. Não era nem para estarmos aqui hoje. Tudo é muito contraditório. Ele falou que fomos aos treinos, que não chegamos atrasados... Falou da parte técnica. Não lembro dele como nada no futebol. Tudo o que ele fala é muito contraditório. Não tem resposta. O próprio assumiu a responsabilidade (das demissões) ao afastar quatro caras empenhados em fazer com que o clube saísse dessa situação difícil. Ele tem o direito de contratar e demitir.

"Agora, os motivos já não cabem mais a mim. Já não estou mais interessado. Meu interesse é que ele assuma as responsabilidades. Tem gente no clube que passa fome, que chega no clube de manhã e faz todas as refeições lá porque não tem dinheiro para fazer compras. As pessoas esquecem que estão falando de seres humanos. O cara chega em casa e tem família. Tem gente que tem filho recém-nascido e não tem dinheiro para comprar leite para o moleque. Aos meus filhos posso dar tudo por conta do meu trabalho. Eu sei o quanto isso é bacana."

"FOI O PIOR"
Quarteto não tem boa recordação do trabalho com Assumpção

RETORNO?
Jogadores dizem que aceitariam voltar após saída de Assumpção

ACUSAÇÃO
Julio diz que cartola quer passar dívida para a próxima gestão

ABANDONO
Bolívar – "Ano passado o presidente honrou os compromissos que tinha conosco, e o time chegou à Libertadores depois de 17 anos. Depois começaram as pendências de salário atrasado. De repente ele não se sentia confortável com a gente. Acredito que ele começou a correr atrás dos compromissos. Os salários estavam muito atrasados. Ele talvez não fosse mais ao clube para correr atrás disso."

PIOR PRESIDENTE?

Julio Cesar, Bolívar e Edilson – "Foi."

Emerson – "Eu não trabalhei com ele, só o vi duas vezes. Gostava dele, de verdade. Fui hospitalizado uma vez em Brasília, e ele me ligou no hospital. Achei de uma grandeza dele me ligar. Não pude falar por causa da minha garganta, mas achei legal da parte dele. Mas agora eu me senti desvalorizado. Desrespeitado mesmo. Tenho uma história no futebol, estava 100% a fim de ajudar, e o cara me dispensa? Não posso falar do caráter dele. Não trabalhei com ele durante muito tempo."

Emerson sorri durante a entrevista coletiva em restaurante da Barra da Tijuca (Foto: André Durão)




ANIVERSÁRIO DO PRESIDENTE

Emerson – "Eu sou super a favor de festa, de chamar os amigos. Fiquei sabendo que ele comemorou o aniversário, mas eu nem sabia da festa (para ser convidado). Devia ser uma galera nada a ver também... (risos)."

VÍDEO DANÇANDO FUNK


Emerson – "A postagem foi extremamente inocente. Quem fez o vídeo foi o meu filho Emerson. Eu me desliguei completamente do Botafogo a partir do momento em que fui demitido. Não acompanho, não ligo mais a televisão para ver vocês. Me desliguei e deixei nas mãos do meu empresário. Nem lembrava que o Botafogo iria jogar no dia seguinte (contra o Palmeiras). Se algum torcedor se sentiu ofendido, me desculpe."

POSIÇÃO DE VAGNER MANCINI

Emerson – "Assim que ficou sabendo do afastamento, ele entregou o cargo. Para mim, isso mostra que o treinador discorda plenamente das atitudes do presidente. Sabemos que, no futebol, às vezes os mais fracos acabam pagando quando uma causa é abraçada. Nada do que o presidente tentou justificar, serviu. Não tem explicação. O Mancini é um cara extraordinário. Não tenho nada para falar dele, pelo contrário. É um cara que Deus colocou na vida do Botafogo. Agora, o presidente tem uma responsabilidade com nós quatro. E tem que assumir isso. As explicações da nossa demissão ele tem que dar para o torcedor, tem que explicar para a torcida. Conosco é outra responsabilidade, e espero que ele cumpra. Se não cumprir, eu tenho algo para falar. Mas, tirando isso, eu já sinto saudades da torcida do Botafogo."

Edilson – Em momento algum eu fiquei chateado com ele, até porque o presidente é a autoridade máxima do clube. Ele (Maurício Assumpção) nos contratou e tem todo o direito de nos mandar embora na hora que quiser. O Mancini é um excelente profissional. Nós entrávamos em campo com todos esses momentos de dificuldade pelos torcedores que o Botafogo tem, pela nossa família, pelo nosso nome e pela comissão técnica, que em todos os momentos segurou a bronca, não abandonou a barca. Fiquei muito feliz de ter trabalhado com o Mancini. A decisão é total do presidente. Acho que ele não entende muito de futebol para ter nos mandado embora alegando deficiência técnica."

DESABAFO
Bolívar rebate acusação de ser um "líder negativo"

APROVAÇÃO
Edílson elogia o técnico Vagner Mancini, mas critica Assumpção

JULIO CESAR
"O presidente tinha de ser homem, falar com a gente e assumir"


DECLARAÇÕES DO PRESIDENTE

Edilson – "O nosso pensamento sempre foi de cobrança normal. Até porque estávamos com meses de salário atrasado. Acho que não era só isso também. Em momento algum pensávamos apenas em nós, jogadores. Pensávamos nos funcionários também. Até no nosso rachão arrecadávamos cestas básicas para eles. Estou sem entender, sem acreditar. Mesmo brigando por coisas legais, não só pelos nossos salários, aconteceu isso. Ele disse que nos afastou por deficiência técnica. Deficiência técnica? Os quatro são peças importantes."

LIDERANÇA NEGATIVA

Bolívar – "Não é uma cobrança. É um direito que tínhamos, o de receber o nosso salário. Sempre fizemos reuniões sem o presidente, mas com pessoas de confiança dele. Sempre tomávamos alguma decisão com a comissão, com todos os jogadores. Era em prol de todos. O Emerson, por exemplo, é um cara que ajudou muito várias pessoas lá dentro. Vimos o caráter dele. Havia pessoas passando dificuldades financeiras. Essa questão de ser líder negativo... Ano passado, o Botafogo fez uma grande campanha. Eu era citado como líder positivo. Esse ano as coisas já começaram erradas. Respeito a decisão do presidente. Mas acho errada, pela falta de consideração com os quatro.

"Teve uma reunião dos jogadores (em abril) para que eu permanecesse. Se sou um líder negativo, eles não pediriam minha permanência. O presidente se colocou mal nessa situação. Como eu poderia mudar assim? Todo mundo conhece a minha história. Ela é muito segura. Nos números do Botafogo, eu sou o atleta com maior minutagem, completando 95 jogos. Estava feliz porque completaria o centésimo, e ele não me deu a oportunidade. E vou bater mais na tecla sobre líder. Fui seis anos capitão da equipe do Internacional. Aí fui para o Botafogo, era um líder positivo e me transformei em líder negativo?

"A liderança que exerço no vestiário é uma questão de ajuda. Vou citar o nome do Dória, porque é um cara que ajudei. Fui padrinho do casamento de um cara que me adora, e que eu adoro também. Não falo que o crescimento dele foi por minha causa, mas muito também por causa dos conselhos que dei. Fico feliz que ele esteja fora do país agora. Acho que minha contribuição foi positiva. Nós temos a mesma pergunta que vocês. Por que não estamos mais no Botafogo? Não tínhamos contato já fazia muito tempo com o presidente. Quando estávamos lá, segurávamos várias situações, cobrávamos uns dos outros. Queríamos o melhor para o Botafogo e vamos continuar querendo, mesmo não estando lá."
Emerson brincou e disse que pode ser
encontrado na praia (Foto: André Durão)

RESCISÕES E SITUAÇÃO

Bolívar – "Eu acabei de rescindir, fiz hoje as últimas assinaturas que faltavam. Da minha parte, não tenho mais vínculo nenhum com o Botafogo. Fico triste pela situação dos companheiros que estão lá. Sempre foi uma relação boa, mas estou procurando me cuidar. Estou treinando para manter a performance e a forma."

Edilson – "Também já acertei a minha rescisão. Agora estou fazendo o tratamento que o clube mandou. Estou machucado."


Julio Cesar – "O meu empresário está cuidando disso. O Botafogo foi o clube que mais gostei de jogar, com o qual mais me identifiquei. Não estou falando da boca para fora. Depois que fui demitido, procurei esquecer um pouco do futebol, ficar mais com a família, com as filhas. Estou aproveitando essas férias forçadas. Mas tenho que manter a forma também. Todos nós não podemos ficar gordinhos para o ano que vem."

Sheik – "Eu estou na praia (risos). De manhã eu vou à praia, depois venho ao Paris 6 jantar todos os dias."

CORPO MOLE E ESTRUTURA DEFICIENTE

Edilson – "O Mancini sabe muito bem que nunca fiz corpo mole. Isso não é do meu perfil. Todo mundo viu a minha entrega durante os jogos. O jogo contra o Ceará (pela Copa do Brasil) foi de muito contato, e acabei me machucando. Acho falta de caráter da parte dele me acusar disso. E infelizmente terei que falar a respeito dos remédios. Paguei o tratamento do meu próprio bolso. Essa foi uma das minhas discussões com o (gerente de futebol, Wilson) Gottardo. Depois que comprei a medicação, aí ele mandou um e-mail. Isso é falta de consideração. Entendemos a situação do clube, mas um clube como o Botafogo não pode deixar faltar remédios. É o fim do mundo."

Emerson – "O Botafogo é um clube de série A, tem que contratar atletas profissionais, jogadores que joguem futebol. Se quiser contratar um cara que não possa sair de campo e falar alguma besteira, que procure algum pastor de igreja evangélica. Vou continuar falando o que penso. Acho que todo mundo sabe que não saí da folha salarial do Corinthians. Meu salário é pago pelo Corinthians. Fui contratado para ajudar o Botafogo. Joguei seis partidas do campeonato com o tendão de Aquiles doendo absurdamente. O Botafogo tem uma história linda, uma torcida linda, mas não tem um campo decente para treinar, no nível de um clube de Série A. Por causa disso, aconteceram várias lesões. Eu citaria aqui várias, mas teria que falar em nome de outros atletas, então não vou falar.

"Hoje mesmo eu disse para a minha irmã que não gosto de perder. Chegava em casa arrasado depois das derrotas. Na cabeça de muita gente, cheguei como uma contratação para resolver os problemas. Sabemos que futebol não é assim, mas eu me cobrava muito e queria ajudar mais. O que passou pela minha cabeça quando fui dispensado foi: 'Esse cara só pode estar de sacanagem!' Vim de um lugar onde não falta remédio, onde meus companheiros não pediam dinheiro para colocar gasolina."

CHANCE DE REBAIXAMENTO

Bolívar – "Até a nossa demissão, o Botafogo não estava na zona de rebaixamento. Entrou um dia depois. Sempre que estivemos lá, procuramos dar o nosso melhor. Queríamos tirar o Botafogo dessa situação."

Emerson – "Uma vez que o próprio presidente assume publicamente que toda a responsabilidade é dele se o clube cair para a Segunda Divisão... São palavras dele. Ele assume. O Botafogo, fora a história toda, tem uma torcida não muito grande, mas vibrante, apaixonada pelo clube. É diferente, tem pessoas de mais idade, levando paz aos estádios."

Julio Cesar – "Acho que não ficou muita pressão para os jogadores que ficaram. O presidente assumiu a responsabilidade, então acho que tirou um pouco do peso (sobre o elenco). Mas o time tem jogadores de qualidade, que podem dar conta do recado. Nós estamos torcendo para o Botafogo sair dessa situação o mais rápido possível."

VOLTAR PARA O BOTAFOGO


Edilson – "Não pensaria duas vezes em voltar se tivesse uma diretoria diferente. Sou muito grato ao Botafogo, ao próprio Sidnei Loureiro (ex-gerente de futebol). Ano passado, quando não estava jogando, quase fui embora. Só não saí por causa dele. É uma pena agora. Ficamos tristes, poderíamos ajudar neste momento difícil. Queria dizer um muito obrigado para a torcida do Botafogo, por tudo o que aconteceu nesse tempo."

Bolívar – "Sou grato aos torcedores. O clube me acolheu. Uma das imagens mais bonitas que já vi na minha carreira como atleta foi aquela frase "O gigante voltou" (na goleada por 4 a 0 sobre o Deportivo Quito, no jogo que garantiu a vaga na fase de grupos da Libertadores). E olha que já joguei em muitos estádios lotados. Mas isso marcou e vai ficar marcado na minha carreira. Voltarei se houver oportunidade."

Emerson – "Voltaria, sem dúvidas. Com uma diretoria certa, com planejamento."

Por Felippe Costa, Richard Souza e Sofia Miranda*Rio de Janeiro* Estagiária, sob supervisão de Daniel Dutra/GE

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