Páginas

sexta-feira, 18 de agosto de 2023

Botafogo, o líder dos comportamentos táticos definidos



Equipe de Bruno Lage é líder porque sabe jogar sempre da mesma forma, independente de lesões, trocas e empréstimos



Luís Castro decidiu ir embora. Tiquinho Soares está lesionado. Gustavo Sauer foi emprestado. Diego Costa vem aí. O acelerado ritmo de mudanças no Botafogo sugere um cenário de queda, mas nada parece mudar a imponência da equipe na liderança do Campeonato Brasileiro.


São 47 pontos conquistados em 57 possíveis. Fato tão impressionante que até faltam explicações: não é um time de craques, de um supertécnico, muito menos de jovens em ascenção. Não é uma máquina de futebol ofensivo, tampouco joga por uma bola. É um time que controla bem seus jogos e vez ou outra se supera, como a virada contra o Internacional.


+ Quantas rodadas o Botafogo demorou para conquistar 45 pontos no Brasileirão? Compare desempenho

+ Em recuperação de lesão, Tiquinho Soares, do Botafogo, recebe visita de Zico


Mas nem sempre o campo tem histórias dignas de Indiana Jones. O Botafogo não tem um segredo, ou uma fórmula mágica. É um time que vence porque joga de forma simples. E repete isso jogo após jogo. Sua grande força está na simplicidade e na consistência.


A prova disso é como a equipe se adaptou sem Tiquinho Soares.


No jogo contra o Internacional, Carlos Eduardo foi o substituto do camisa 9. Bruno Lage não mudou absolutamente nada no time. O Botafogo continuou a jogar no 4-2-3-1 que marca com duas linhas. Assim como Tiquinho, Carlos Eduardo buscou marcar o setor onde estava a bola e se movimentava pelos lados para criar superioridade e proteger a linha de defesa.



Sem Tiquinho, Carlos Eduardo fez a mesma função contra o Internacional — Foto: Reprodução


E no ataque? Carlos procurou copiar Tiquinho. Ora ele buscava o lado para apoiar uma bola longa vinda de Perri. Ora ficava mais à frente, segurando os zagueiros para Lucas Fernanes e Tchê Tchê aparecerem de trás. Nos momentos em que prendia a bola longa, João Victor se projetava e buscava atacar um espaço para receber o passe na frente.



Carlos Eduardo buscou segurar as bolas longas, jogada forte do Botafogo — Foto: Reprodução



Não existe nenhuma diferença com o que Tiquinho fazia. O segredo está justamente nessa consistência.


O olhar de quem gosta de futebol, seja torcedor e até dirigente, é muito voltado para o individual. Olhamos muito para a bola e pouco para o entorno. Só que o individual não pode ser separado do restante num jogo que envolve onze pessoas unidas o tempo todo. Futebol é um esporte essencialmente coletivo.


Carlos Eduardo fez o mesmo que Tiquinho porque ele treinou para tal. Repetiu na vitória e na derrota. Até virar automático, como um hábito. O nome que a ciência dá para isso é comportamento: uma coisa que você repete, mesmo sem saber o motivo, e que mexe contigo e com o entorno.


O segredo do Botafogo é a simplicidade de ter comportamentos bem definidos que não dependem de um lance de mágica que só um craque pode dar. Que não dependem nem mesmo da continuidade do treinador. Dependem apenas de ter uma definição e ser seguido por quem esta em campo. E depende demais da repetição, na vitória ou na derrota. Afinal, todo comportamento ou estilo de jogo pode dar certo: basta ser bem executado.





Bruno Lage em Botafogo x Guaraní-PAR pela Sul-Americana — Foto: Vítor Silva / Botafogo



O Botafogo é líder porque repete, insiste, joga sempre da mesma maneira. Joga da mesma maneira do ano passado, quando Luís Castro colocava ao menos um lateral para jogar pelo centro do campo e ajudar Patrick de Paula a ter mais espaço para pensar o jogo de trás. Patrick se lesionou, o Fogão trocou os laterais e os comportamentos seguem os mesmos: um lateral por dentro enquanto o volante tem a bola.


Contra o Internacional, essa dupla foi Tchê Tchê e Hugo. Contra o Guarani, Marçal fez o papel de Hugo. Os nomes mudam, os comportamentos continuam.





Ataque posicional do Botafogo: lateral por dentro e meia por trás, com espaço para lançar — Foto: Reprodução


É cada vez mais difícil que nosso olho enxergue a simplicidade e a constância como fatores de sucesso. O ser humano sempre contou histórias de heroísmo e divindades. De talento e exuberância. Somos fascinados por seres com grandes poderes e acontecimentos que mudam nossas vidas.


Quem nunca esperou que a vida fosse como num filme? As redes sociais pioram a questão: tudo precisa ser mágico em 15 segundos. Tudo precisa ser grandioso, imenso, exagerado.


O cotidiano, muitas vezes, é chato e sem cor. Apenas um emaranhado de esforços repetitivos, que somados, produzem um resultado como o salário no fim do mês. Futebol é vida. Um time de sucesso nada mais é do que o produto de muito trabalho e constância muito mais do que um lindo passe ou um drible de mágica.


Pode parecer - e é um choque no romantismo do qual o jogo ainda é tratado. Mas o Botafogo de Tiquinho, de Lage e agora de Diego Costa é uma grande lição para que a simplicidade e a constância sejam vistas com mais glamour. São elas as grandes responsáveis pelo primeiro turno absurdamente bom que esse time faz.





Fonte: ge/Por Leonardo Miranda
Jornalista, formado em análise de desempenho pela CBF e especialista em tática e estudo do futebol

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário é sempre bem vindo. Participe com suas opiniões!