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quarta-feira, 8 de maio de 2013

Seedorf faz família viver o clima do título: 'Vai ficar para o resto da vida


Em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM, craque holandês conta que filho vestiu a medalha de campeão e comenta sobre seu futuro e o do Botafogo



Aos 37 anos e acostumado a comemorar grandes títulos, como os três da Liga dos Campeões que possui no currículo, Seedorf parecia um iniciante ao celebrar, com lágrimas nos olhos, a conquista do Campeonato Carioca no último domingo. Nessa terça, enquanto curtia sua folga, ainda com entusiasmo e brilho nos olhos, o camisa 10 do Botafogo conversou com o GLOBOESPORTE sobre o primeiro título estadual de sua carreira.

O meia lembrou que os jogadores deixaram de lado os problemas que enfrentaram, como o atraso de salários, para gravar seus nomes na história do Glorioso. Ele destacou a vibração de seus familiares, que não foram a Volta Redonda e assistiram ao jogo pela televisão, no Rio.

- O Carioca, grande ou pequeno que seja, vai ficar para o resto da vida. Ninguém vai mudar que este time ganhou uma taça, na verdade três (Guanabara, Rio e Carioca), no começo de 2013. Vai ficar com a gente para sempre, e o dinheiro acaba. Temos que ter sempre esta motivação. Cheguei em casa muito tarde no domingo, deixei a medalha para meus filhos antes de irem para a escola. Quando levantei, vi que tinham mexido. Mais tarde, meu filho a colocou no peito. Todos ficaram felizes.

Animado, Seedorf acredita que o Botafogo tem o direito de traçar o título como meta no Campeonato Brasileiro, porém alertou para a importância de manter o elenco em meio à crise financeira vivida pelo clube.

Ao falar sobre seu futuro, o meia garantiu que não recebeu qualquer proposta para ser técnico do Milan na próxima temporada europeia, apesar de o presidente Silvio Berlusconi ter feito sondagens. O holandês reconheceu que trabalhar à beira do campo aparece como um caminho natural depois que pendurar as chuteiras. Gratos pela participação do holandês no título carioca, os alvinegros esperam que este dia demore a chegar.

Confira a entrevista completa com Seedorf:

GLOBOESPORTE.COM: O Botafogo vive um momento mágico e você ganhou seu primeiro título importante pelo clube. Qual é a sua parcela para esta boa fase e para esta conquista?

Seedorf: Para mim, é difícil falar destas coisas, prefiro até que outras pessoas avaliem. Tento fazer o que sempre fiz na minha carreira, ajudando dentro e fora de campo. Sou um cara que faz tudo para o grupo ficar forte como um todo. Ninguém pode fazer nada sozinho. Para conseguir qualquer coisa na vida, você precisa de ajuda, de união de forças. Acho que este espírito foi meu foco principal, além da ambição de querer melhorar a cada dia.




Durante o campeonato, houve uma fase complicada, quando o time empatou com o Boavista, perdeu para o Flamengo e teve dificuldade para vencer o Resende. Muito se fala do clima do vestiário naqueles jogos, mas o que foi determinante para a equipe passar a ter apenas vitórias?

Não gosto muito de compartilhar as coisas que acontecem internamente. Não precisa. São coisas que acontecem em qualquer casa. Há momentos de alegria, de tensão... Quando se está construindo algo, há falhas, erros e cobranças para melhorar a situação. Quando todos entenderam que precisamos ter uma certa mentalidade, determinação, lealdade e colocar de lado aspectos pessoais, as coisas mudam. Aí o grupo fica forte, e o resultado é uma consequência. Podem ter mais equipes assim, mas ao menos vamos ser sempre competitivos e difícil de sermos batidos.

No seu currículo há títulos importantíssimos, como a Liga dos Campeões, e a sua emoção após conquistar o Carioca o levou a chorar. O que este troféu representa para você?

Vivo muito intensamente o que faço. Quem acompanha o dia a dia vê o suor, o trabalho, os momentos de dor quando há uma lesão, problemas internos, viagens, sacrifícios físicos... Jogamos contra times que sempre fazem o jogo da vida contra nós. Então, se não tem a motivação certa, você perde para os pequenos. Tivemos dificuldades contra o Resende e o Boavista. Então, todas estas coisas eu vivo sempre intensamente. Quando se consegue um título, é como um carimbo de que o trabalho foi bem feito, a missão foi cumprida. Emoção, seja ela grande ou pequena, faz parte da minha espiritualidade.
Sonhar não faz mal a ninguém, mas também tem que trabalhar todos os dias. Conhecemos os problemas que o Botafogo ainda tem, como tantos outros clubes, financeiramente falando. Não vai ser fácil segurar alguns jogadores."
Seedorf

Em qual momento do campeonato você acreditou que o Botafogo estava preparado para o título?

A disciplina tática foi crescendo bastante. O importante foi ser um grupo forte fora de campo primeiro, para depois ser dentro do campo. Não digo só os jogadores, mas todos: setor médico, auxiliares, diretoria... todos têm que pensar na mesma direção. Mas claro que, no fim, são os atletas que vão levar a bandeira. Acho que chegou um momento em que havia essa união de pensamento.

Como foi a reação da família ao primeiro título no Brasil?

Eles acompanharam pela televisão. Estão tão acostumados que nem deram tanta importância (risos). Estou brincando. Não os encontrei depois do jogo, cheguei em casa muito tarde. Deixei a medalha para eles verem antes de irem para a escola. Quando levantei, vi que tinha mexido. Mais tarde, meu filho a colocou no peito. Todos ficaram felizes. Com certeza viveram uma tarde bonita.

Depois de quase um ano no Brasil, o que mais você sente diferença em relação ao futebol europeu, seja na parte tática ou arbitragem?

Todos os países são diferentes entre si. A Itália é diferente da Espanha, que é diferente da Holanda. São culturas diferentes, as pessoas pensam de maneiras diferentes. Uns mais passionais, outros mais frios. Não gosto de comparar, não adianta muito. No Brasil tem muita paixão, é o país do futebol mesmo, não tem jeito. É um país em que há muitas camisas na rua, cada um faz questão de mostrar que é ligado a algum clube. Estádios vazios? É um momento social do país, acredito que a economia vai crescer e dar a possibilidade de que as pessoas também possam fazer o que gostam, ir ao estádio. Os governos vão conseguir dra uma infraestrutura melhor. Precisa de tempo, mas com certeza o Brasil não vai ficar atrás. Nos próximos 25 anos vai evoluir muito.

O presidente Maurício Assumpção já declarou que sua contratação foi importante também para suprir a carência de ter um grande ídolo e que você chacoalhou todos os conceitos de profissionalismo. Concorda com ele?

Não sei (risos). Não estava aqui antes. Mas é um prazer passar coisas boas para os brasileiros, e quero continuar assim. É uma troca, também recebi muitas coisas boas, muito carinho e afeto. Isso me ajudou, a adaptação não é fácil. Começando pelos meus companheiros, pelo Oswaldo, todos tentaram me ajudar a facilitar minha adaptação.

No último Brasileiro, o Botafogo terminou em sétimo. Acredita que o time está preparado para conquistar uma vaga na Libertadores e lutar pelo título desta vez?

Todo mundo está querendo saber isso. São muitos jogos pela frente, o campeonato ainda está por começar. Sonhar não faz mal a ninguém, mas também tem que trabalhar todos os dias. Conhecemos os problemas que o Botafogo ainda tem, como tantos outros clubes, financeiramente falando. Não vai ser fácil segurar alguns jogadores. Acho que vai ter muita movimentação no mercado, porque os clubes precisam sobreviver. Mas o bom é que estamos jogando um bom futebol, e isso é importante porque o Brasil é conhecido por isso, por esse futebol de qualidade.

Seedorf orgulhoso com o troféu de campeão da
Taça Rio (Foto: André Durão / Globoesporte.com) 
Você acredita que o hoje o Botafogo reflete o que você pensa do futebol brasileiro, o jogo bonito?

O Botafogo está refletindo o que o Oswaldo de Oliveira está querendo. Ele está tentando que os jogadores possam se expressar dentro de campo da melhor maneira possível. Com a qualidade, normalmente acontece este tipo de jogo. Eu não escolheria um time que só quer correr, que só colocasse a bola para frente para lutar o tempo todo. O importante é bola no chão e fazer muitos gols. É uma filosofia de que gostei muito.

Acredita que é possível medir se o Botafogo atual poderia competir de igual para igual nas principais ligas da Europa?

Não dá para comparar. Sei que todos gostariam de saber, mas não é assim. O Brasil tem que olhar para dentro e para a América do Sul e ver como pode melhorar em âmbito internacional. Quem pode ter essa avaliação é a Seleção. Porque você leva todos os melhores jogadores do Brasil contra os melhores do resto do mundo, aí podemos ver a diferença, porque jogaria contra os melhores italianos, os melhores holandeses, ingleses... Nessa avaliação, os outros também querem saber se são competitivos contra os brasileiros, considerados os melhores do mundo. Acho muito importante o foco nas escolas dentro dos clubes, essa é uma pequena preocupação que tenho. Tem que ter mais investimento em infraestrutura na base.

O elenco do Botafogo viveu uma situação complicada durante o Carioca, o atraso de salários. Como você observou este problema?

Na Europa também tem isso. No Botafogo, o grupo soube lidar bem com o problema ganhando o Carioca, ajudando o clube a cumprir com os seus deveres. Os patrocinadores também estão mais abertos e empolgados em investir no clube hoje do que há três meses. Foi a força do grupo que fez superar e olhar para a verdadeira ambição que tem que ter. Não é dinheiro, que é uma consequência do trabalho. Todo mundo quer ganhar bem, claro, e é preciso dinheiro para viver, mas, quando essa é a principal motivação, é difícil. É preciso uma coisa maior, superior. Foi isso que esse elenco conseguiu. O Carioca, grande ou pequeno que seja, vai ficar para o resto da vida. Ninguém vai mudar que este time ganhou uma taça, na verdade três (Guanabara, Rio e Carioca), no começo de 2013. Vai ficar com a gente para sempre, e o dinheiro acaba. Temos que ter sempre esta motivação. Claro que é preciso cobrar, mas o Botafogo está trabalhando para solucionar este problema. Estão com vontade de cumprir os deveres. Com o tempo, vai melhorar.



O Engenhão está interditado e sem previsão de reabertura, e o Maracanã está bem próximo de ser novamente utilizado. Qual é sua expectativa para jogar lá? Já passou por perto recentemente?

Espero jogar no Maracanã, sim, sempre foi um sonho. Da mesma forma que foi com o Azteca, no México, o Santiago Bernabéu, o San Siro... os grandes estádios do mundo. Espero que consigam limpar o entorno, porque, pelo que soube, é o principal problema agora. É um pecado ter que viajar para Volta Redonda, com todo o respeito. É um lugar que nos deu alegria, que tem um bom ambiente para o futebol, mas quantas pessoas estamos deixando fora por causa do tamanho do estádio? Se pudermos usar o Maracanã, seria maravilhoso.

O Botafogo tem tentado usar sua fama internacional para alavancar projetos de marketing. Você se sente feliz em poder ajudar também desta forma?

Não sei quanto o Botafogo soube, conscientente, utilizar minha imagem no mundo. Acho que foi uma consequência natural o mundo reconhecer mais o clube por causa da minha presença. Projetos internos ainda não foram feitos especificamente, por vários motivos, mas com certeza as minhas ações aqui no Brasil interessam ao mundo, e o Botafogo acaba recebendo uma atenção superior.

No Rio de Janeiro, é comum as pessoas famosas virarem alvo de paparazzi, especialmente na região de Ipanema e Leblon, onde você mora. Até o momento, você só foi clicado andando de bicicleta na orla. Como faz para manter a sua discrição e a da sua família?

A minha vida que é assim, eu não sou interessante para paparazzi, não. Não faço as coisas que eles querem (risos).

Seedorf na festa de comemoração do título, em
General Severiano (Foto: Satiro Sodré / Agif) 
Você está perto de entrar em seu último ano de contrato. A torcida já pode sonhar com uma ampliação deste vínculo?

Ainda temos contrato, não estou nem pensando nisso. Temos vários objetivos pela frente, como a Copa do Brasil. Isso são coisas de mercado. Sempre falo: quando tem uma coisa concreta, a gente senta e fala.

Você já comandou treinos para jovens do Boavista e Nova Iguaçu. Na Itália, seu nome é frequentemente apontado como um possível técnico do Milan no futuro. Quais são os seus planos para quando decidir parar de jogar?

Ser treinador é algo que gostaria de ser e estou me preparando para isso faz tempo. Não diretamente no campo, mas em outros aspectos. Treinador não é apenas um trabalho de campo, são muitas coisas envolvidas. Sempre são publicados estes interesses de clubes, mas de concreto não tem nada. Quando tiver, podemos conversar melhor. Já tenho minhas empresas, quero ter uma atividade fora do mundo do futebol diretamente. Sou empreendedor.

Por que a música "One Love", do Bob Marley? Gostaria de ver essa música nas arquibancadas nos jogos do Botafogo?

Eu cantei essa canção porque, no fim, tem que procurar amor na vida. Entre os torcedores, é importante limitar o ódio, não precisa disso, já há bastante no mundo. É uma coisa bonita a rivalidade esportiva, mas tem que saber limitar. Foi bonito ver torcedores de Botafogo e Fluminense praticamente juntos. É uma festa para todo mundo. Quando acaba o jogo, recomeça a vida. Flamenguistas, botafoguenses, tricolores e vascaínos precisam manter esse respeito. A gente sabe que o futebol é um esporte que envolve muito dinheiro, mas tem muita paixão também. É um momento importante da semana para algumas pessoas ver o time jogar. Gosto de passar que é preciso manter essa tranquilidade de aceitar os resultados. Estou gostando desse ambiente aqui no Rio. Sinceramente, todos os clássicos foram bonitos.

Por Fred Huber e Thales Soares Rio de Janeiro

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